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Trata-se de extratos da obra em epígrafe, e traz a disciplina dos recursos especial e extraordinário resumidamente. Para a compreensão da matéria é conveniente estar com a legislação em mãos para fazer a leitura concomitante. Lembro ainda que, esta obra está disponível para download, na aba respectiva.
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Trata-se de extratos da obra em epígrafe, e traz a disciplina dos recursos especial e extraordinário resumidamente. Para a compreensão da matéria é conveniente estar com a legislação em mãos para fazer a leitura concomitante. Lembro ainda que, esta obra está disponível para download, na aba respectiva.
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9.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO E RECURSO ESPECIAL
A Seção II do Capítulo VI
do Título II do Livro III da Parte Especial trata concomitantemente do recurso
extraordinário e do recurso especial. Há duas subseções pelas quais a
disciplina é dividida: disposições gerais (arts. 1.029 a 1.035) e julgamento
daqueles recursos quando repetitivos (arts. 1.036 a 1.041).
Nesse número, ocupo-me
com as disposições gerais; no próximo, enfrento a sistemática daqueles recursos
quando repetitivos.
O prezado leitor
perceberá que não há, no CPC de 2015, nada sobre o cabimento do recurso extraordinário
e do recurso especial, apenas com relação ao seu processamento. O legislador sequer
quis repetir a CF, diferentemente do que fez para o recurso ordinário, talvez
para resistir à tentação de alterar nem que fosse uma pequena palavra, de fato,
ocorreu no art. 1.027.
O que há, de muito melhor
técnica legislativa, é a previsão do art. 1.029 que, sutil e suficientemente,
faz referência às hipóteses constitucionais de cabimento daqueles recursos.
Assim, antes do estudo do
processamento daqueles recursos, cabe extrair da CF o que ela reserva para o
cabimento daqueles recursos.
A previsão do recurso
extraordinário está no inciso III do art. 102 da CF, assim redigido: “Art. 102.
Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição,
cabendo-lhe: (...) III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas
decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: a)
contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade
de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado
em face desta Constituição; d) julgar válida lei local contestada em face de
lei federal”.
Todas as hipóteses de
cabimento do recurso extraordinário dizem respeito, em última análise, a questões
de direito constitucional federal, o que não poderia ser diferente diante do
caput do art. 102 e da missão precípua do STF, de modo a viabilizar que aquele
Tribunal, no exercício de sua competência recursal extraordinária, estabeleça
os parâmetros interpretativos sobre a CF a serem observados em todo o
território nacional. Isso mesmo nos casos das alíneas c e d, quando há referência
a confronto entre leis. É que naqueles casos, prezado leitor, o que está em
discussão é, antes de tudo, a repartição constitucional das competências (os
arts. 22, 24 e 30 da CF, principalmente) e, portanto, o que se quer definir é
qual ente federado tem, por causa da CF, competência para legislar sobre o quê.
É necessário extrair do
inciso III do art. 102 da CF, outrossim, o entendimento de que o recurso extraordinário
pressupõe decisão proferida em única ou última instância. Não há, aqui, necessidade
de ela ter sido proferida por nenhum Tribunal, sendo bastante que da decisão
não caiba mais nenhum outro recurso ordinário, nos termos da classificação que
proponho no n. 2.2, supra. A exigência, além de confirmar a necessidade e a
importância da causa decidida, marca a função, a ser exercida pelo STF no
exercício de sua competência recursal extraordinária, de estabelecer parâmetros
interpretativos objetivos das questões constitucionais. Não se trata de uma
nova, terceira ou quarta instâncias. Como aquele dispositivo não faz nenhuma
menção a Tribunal, é correto entender que é possível recurso extraordinário de
decisões dos Juizados Especiais, desde que se tratem das decisões sobre as
quais não caiba nenhum outro recurso.
Além da demonstração da
questão constitucional e de que se trata de decisão proferida em única ou
última instância, o recurso extraordinário deverá também ostentar repercussão
geral. É o que exige o § 3º do art. 102 da CF nos seguintes termos: “No recurso
extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões
constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal
examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de
dois terços de seus membros”. É como se a alegação de contrariedade à CF não fosse
ela própria suficiente para demonstrar a gravidade da situação, impondo ao
recorrente que demonstre um plus, objeto de regulação infraconstitucional no
art. 1.035, o que me ocupa no n. 9.3, infra. A repercussão geral acaba fazendo
as vezes de um verdadeiro filtro que permite ao STF deixar de julgar casos que,
no seu entender, não apresentam as referidas exigências constitucionais.
As hipóteses de cabimento
do recurso especial estão no inciso III do art. 105 da CF, assim redigido:
“Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: (...) III – julgar, em
recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos
Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal
e Territórios, quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei
federal, ou negar-lhes vigência; b) julgar válido ato de governo local
contestado em face de lei federal; c) der a lei federal interpretação
divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal”.
Similarmente ao que
acabei de acentuar com relação ao recurso extraordinário, o recurso especial volta-se
a questões de direito infraconstitucional federal. O que se quer com ele, em
última análise, é viabilizar que o STJ, no exercício de sua competência
recursal especial, dê a última palavra sobre a interpretação da lei federal em
todo o território nacional. Mesmo nos casos da alínea b do inciso III do art.
105, o confronto lá retratado diz respeito ao prevalecimento de lei federal
sobre ato infralegal estadual.
As mesmas considerações
que fiz com relação ao recurso extraordinário e à necessidade de exaurimento de
instância são imprescindíveis para o recurso especial, que também pressupõe a causa
decidida. Única diferença, contudo, é que para o especial, importa que a
decisão recorrida para o STJ tenha sido proferida por TRF ou por TJ. É o que
basta para descartar, sob pena de violar o modelo constitucional, o recurso
especial de decisões proferidas no âmbito dos Juizados Especiais, mesmo quando
exauridos todos os recursos nele cabíveis. É o entendimento consagrado (corretamente)
pela Súmula 203 do STJ.
Como esclareço no n. 2.2,
supra, é comum agrupar os recursos extraordinário e especial (e isso vale
também para os embargos de divergência) em contraposição aos demais recursos
para, classificando-os de extraordinários, enfatizar a sua função primária de
definição da interpretação e da uniformização do direito constitucional e
infraconstitucional brasileiro e somente em segundo plano satisfazer o
interesse das partes. Tanto assim – e de forma absolutamente coerente com o seu
modelo constitucional – que estes recursos não se prestam a reexame de prova
(por isso as Súmulas 279 do STF e 7 do STJ) ou a reexaminar cláusulas
contratuais (por isso as Súmulas 454 do STF e 5 do STJ). São recursos, é certo
afirmar, de direito estrito. A partir de um dado quadro fático estabelecido
soberanamente pelas instâncias anteriores, cabe ao STF ou ao STJ aplicar a CF
ou a lei federal, respectivamente.
Também, e sem prejuízo do
que já escrevi, é fundamental compreender que os recursos pressupõem, por isso
e por nenhuma outra razão, o que os incisos III dos arts. 102 e 105 da CF chamam
de “causa decidida”. A função de revisão e de controle da constitucionalidade e
da legislação federal pressupõe prévia decisão anterior. Se nada decidiram, não
há padrão de confronto com a CF ou com a legislação federal. A afirmação merece
ser entendida amplamente porque pode acontecer que aquilo que foi decidido o
tenha sido de maneira errada, não levando em conta o arcabouço constitucional
e/ou legal federal aplicável à espécie. Se assim ocorreu, contudo, é
irrecusável que o que foi decidido, no lugar do que deveria ter sido, tem
aptidão de contrariar a CF ou a lei federal. É o que basta, no ponto, para o
cabimento do recurso extraordinário ou do especial.
É comuníssimo tratar de
pré-questionamento quando o assunto é recurso extraordinário e recurso especial.
O próprio CPC de 2015 o faz em duas oportunidades, no § 3º do art. 941 e no
art. 1.025.
Para cá, basta frisar o
que escrevo no n. 3.4 do Capítulo 16 e no n. 7.7, supra, quando trato daqueles
dispositivos, respectivamente: trata-se de uma falsa exigência, não obstante
ser consagradíssima pela prática, pela doutrina e, há cinquenta anos, pela
própria jurisprudência do STF assim como, mais recentemente, também pela do
STJ. O que é constitucionalmente exigido para o cabimento do recurso
extraordinário e para o recurso especial é o que acabei de evidenciar, nos
precisos termos dos incisos III dos arts. 102 e 105 da CF. Nada além daquilo,
nada, pois, de pré-questionamento.
O que é necessário para o
cabimento do recurso extraordinário é haver a alegação de que houve violação à
CF a partir de causa decidida por única ou última instância; para o cabimento
do especial, a alegação de violação à lei federal pressupõe causa decidida por
única ou última instância pelo TRF ou pelo TJ. Para além da alegação da
violação – os recursos são de fundamentação vinculada –, saber se ela existe,
ou não, já é mérito. Repito: nada de prequestionamento.
Por isso, deixo o
seguinte convite ao prezado leitor: toda vez que a palavra prequestionamento aparecer,
leia-a e entenda-a como sinônimo de causa decidida.
9.1
Petição de interposição
Bem entendidas as
hipóteses de cabimento do recurso extraordinário e do recurso especial, dou início
à análise dos dispositivos codificados que tratam de seu processamento.
O art. 1.029 trata da
petição de interposição daqueles recursos. Eles serão apresentados, de acordo
com o caput daquele dispositivo, perante o Presidente ou o Vice-presidente dos
TJs ou TRFs – competência definida pelos respectivos regimentos internos – em
petições distintas, isto é, uma para cada recurso, que conterão, além das
exigência de todos os demais recursos, o seguinte: (i) a exposição do fato e do
direito; (ii) a demonstração do cabimento do recurso interposto; (iii) as razões do pedido de reforma ou de
invalidação da decisão recorrida.
Em se tratando de recurso
especial fundamentado na letra c do inciso III do art. 105 da CF – o chamado
recurso especial pela divergência –, é ônus do recorrente demonstrar a
divergência jurisprudencial, observando o disposto no § 1º do art. 1.029, que
se refere a duas ordens de demonstração.
A primeira é a formal,
consistente na prova de que há acórdão divergente daquele que foi proferido no
caso concreto a justificar a atuação do STJ com a finalidade de compor a
divergência entre tribunais diferentes, estabelecendo qual é a interpretação a
ser observada. A prova deste acórdão divergente (o paradigma) deve ser feita
com certidão, cópia ou citação do repositório de jurisprudência, oficial ou
credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que ele tiver sido publicado,
ou, ainda, com a reprodução de julgado disponível na rede mundial de
computadores, sempre com a indicação da respectiva fonte.
A segunda demonstração é
de ordem substancial, conhecida pela prática de demonstração analítica da
divergência, isto é, a necessidade de o caso concreto julgado e o indicado como
paradigma serem comparados para comprovar que situações fáticas essencialmente
iguais receberam tratamento jurídico diferente. É o que a parte final do § 1º
do art. 1.029 quer dizer quando exige que sejam mencionadas “as circunstâncias
que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados”.
Nenhuma das exigências é
vazia de significado e não podem ser concebidas como exigências puramente
formais. Sua razão de ser é a de viabilizar ao STJ o exercício de sua
competência recursal especial a partir de algo que, para um Estado federado, é
gravíssimo: situações fáticas essencialmente iguais sendo tratadas
diferentemente a partir de um mesmo contexto normativo.
A exigência feita pelo §
2º do art. 1.029, que veda o indeferimento do recurso fundamentado na divergência
“com base em fundamento genérico de que as circunstâncias fáticas são
diferentes, sem demonstrar a existência da distinção”, é pertinente e decorre
naturalmente do direito jurisprudencial extraível dos arts. 926 e 927. O
recorrente tem, justificadamente, o ônus argumentativo de demonstrar a
disparidade de soluções jurídicas para casos essencialmente iguais e o
indeferimento de sua pretensão deve se basear também no ônus argumentativo
oposto, de que não há aquela disparidade, levando em conta o caso concreto, o
julgado concreto, o paradigma concretamente eleito para dar fundamento ao
recurso e não o que o inciso III do § 1º do art. 489 encarrega-se de repelir,
“invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão”, sem
prejuízo, evidentemente, do que deve ser extraído dos incisos V e VI daquele
mesmo dispositivo.
Ainda com relação à
interposição do recurso, cabe destacar o § 3º do art. 1.029. De acordo com o dispositivo,
o STF ou o STJ podem desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou
determinar sua sanação, desde que não o repute “grave”. Trata-se da aplicação,
com infeliz e restritiva ressalva (afinal, o que é erro “grave”?), da regra
contida no parágrafo único do art. 932 para os recursos em geral.
Não há razão nenhuma, a
não ser o texto do dispositivo, que justifique o tratamento diferente. É o caso
de considerar como não escrita a referida ressalva, porque restritiva e arredia
ao sistema processual relativo à nulidade dos atos processuais.
9.2
Efeito suspensivo
O § 5º do art. 1.029,
similarmente ao que o § 3º do art. 1.012 regula para a apelação, trata da competência
para concessão de efeito suspensivo ao recurso extraordinário ou recurso
especial. Ele será dirigido: (i) ao STF ou ao STJ, no período compreendido
entre a interposição do recurso e sua distribuição, ficando o relator designado
para seu exame prevento para julgá-lo; (ii) ao relator, se já distribuído o
recurso; ou (iii) ao Presidente ou Vice-presidente do Tribunal local, no caso
de o recurso ter sido sobrestado, porque repetitivo, nos termos do art. 1.037.
A regra vem para colocar
fim a problemas práticos que chegaram perto da insolubilidade e para os quais
pouco contribuíram as Súmulas 634 e 635 do STF, totalmente dissociadas da
sistemática do CPC de 1973 sobre o tema que, felizmente, não têm mais razão de
ser com o CPC de 2015.
À falta de previsão em
sentido diverso, os referenciais para a atribuição do efeito suspensivo são os
do parágrafo único do art. 995, sendo suficientes as considerações que exponho
no n. 3.2, supra, a propósito, destacando a necessidade de interpretação
ampliativa daquele dispositivo.
9.3
Demonstração da repercussão geral
O art. 1.035 disciplina
como deve ser feita a demonstração da repercussão geral do recurso extraordinário,
verdadeiro requisito de admissibilidade específico daquela espécie recursal.
Requisito este que só
pode ser examinado privativamente pelo STF, o qual só poderá negar seguimento
ao recurso, por esse fundamento, por decisão de dois terços de seus membros,
isto é, pelo entendimento de oito Ministros (art. 102, § 3º, da CF).
A repercussão geral,
escrevo no n. 9, supra, deve ser compreendida como um plus a atestar, concretamente,
a potencialidade de as alegações de violação à CF ultrapassarem os limites subjetivos
do processo, passando a interessar, por isso mesmo, a um número indeterminado
de pessoas e recomendar (na verdade, a exigir) a manifestação do STF, tomando
partido sobre a questão constitucional.
Para o § 1º do art.
1.035, a repercussão geral consiste na existência de questões relevantes do ponto
de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses
subjetivos do processo.
Complementando-o, o § 3º
do art. 1.035 presume a existência da repercussão geral quando o recurso
voltar-se a acórdão que: (i) contrariar súmula ou jurisprudência dominante do
STF (sendo certo que, antes da revisão do texto do CPC de 2015, o dispositivo
referia-se a “precedente”); (ii) tiver sido proferido em julgamento de casos
repetitivos (o referencial é o do art. 928), e (iii) tenha reconhecido a
inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da
CF, o que deve ser entendido de maneira ampla, inclusive quando o incidente de
arguição de inconstitucionalidade é dispensado (art. 949, parágrafo único). A
previsão afina-se aos indexadores jurisprudenciais propostos pelo próprio CPC
de 2015, em especial por seu art. 927.
A demonstração de que o
recurso extraordinário ostenta repercussão geral é ônus argumentativo do
recorrente que dele deve se desincumbir em sua petição recursal, no que é claro
o § 2º do art. 1.035, que reitera o comando proveniente do § 3º do art. 102 da
CF sobre ser sua apreciação exclusiva (privativa) do STF.
Para a pesquisa sobre
determinada questão constitucional ostentar, ou não, repercussão geral, pode o
relator, com fundamento no § 4º do art. 1.035, admitir manifestação de
terceiros, subscrita por procurador habilitado, observando o que dispõe o
RISTF.
Se o relator do recurso
extraordinário reconhecer a repercussão geral, determinará a suspensão dos
processos, individuais e coletivos que versem sobre aquela mesma questão em
todo o território nacional (art. 1.035, § 5º).
O § 6º do art. 1.035
admite que o interessado requeira, ao Presidente ou ao Vice-Presidente do Tribunal
de origem, que exclua da decisão de sobrestamento recurso extraordinário
interposto intempestivamente para inadmiti-lo desde logo. A razão de ser da
regra é a de fazer prevalecer, nesses casos, a decisão já transitada em julgado
(ao menos formalmente) já que o recurso é intempestivo. O interessado referido
pelo dispositivo só pode ser aquele a quem o reconhecimento da intempestividade
favorece. Nesse sentido, coincide com o recorrido. O recorrente deverá ser intimado
para se manifestar sobre o requerimento no prazo de cinco dias, de acordo com o
mesmo dispositivo.
Sendo indeferido o
requerimento de exclusão a que se refere o § 6º, o interessado poderá interpor o
agravo do art. 1.042, denominado agravo em recurso extraordinário, ao qual me
volto no n. 10, infra (art. 1.035, § 7º).
Não há prazo para que o
interessado formule o pedido de exclusão do recurso por força de sua intempestividade
a qualquer tempo. O melhor entendimento parece ser o de que o prazo para tanto
é de cinco dias. Não só por força da incidência do § 3º do art. 218 diante da
lacuna legislativa, mas, também por causa da isonomia processual, já que o § 6º
do art. 1.035 reserva aquele prazo para o recorrente exercitar o contraditório.
O prezado leitor
perguntará, pertinentemente, o que fazer se houver sobrestamento indevido. Nada
é dito com relação ao assunto. A melhor resposta, penso, é a de adotar aqui a
sistemática dos §§ 8º a 13 do art. 1.037, tal qual a exponho no n. 9.8.4,
infra. É certo que nem toda a repercussão geral pressupõe, para que seja
atestada a sua existência, “multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica
questão de direito” (eis o referencial dos recursos repetitivos empregado pelo
caput do art. 1.036). Também é correto entender que o sobrestamento regrado
pelos §§ 5º a 8º do art. 1.035 só se justifica pela ocorrência de casos
múltiplos. Fosse um único caso – mesmo que bastante para o reconhecimento da
repercussão geral da questão constitucional nele decidida – e o problema de que
tratam aqueles dispositivos simplesmente não existiria. Por isso, a incidência
do regime de distinção dos §§ 8º a 13 do art. 1.037, inclusive na perspectiva
recursal, para cá é imperiosa, até como necessária decorrência do bom
funcionamento do direito jurisprudencial querido pelo CPC de 2015.
Pela necessária
incidência da sistemática do “julgamento de casos repetitivos” do art. 928, entendo
aplicável, à hipótese ora examinada, o § 2º do art. 982, segundo o qual
“durante a suspensão, o pedido de tutela de urgência deverá ser dirigido ao
juízo onde tramita o processo suspenso”. Trata-se, como escrevo no n. 9.6.4 do
Capítulo 16, de regra que deriva diretamente do inciso XXXV do art. 5º da CF,
sendo suficientes para cá as considerações que lá faço a respeito da regra.
Se a existência da
repercussão geral for negada pelo STF, os recursos sobrestados nos termos do §
6º do art. 1.035, que só podem ser os que versem sobre matéria idêntica, terão
seu seguimento negado pelo Presidente ou pelo Vice-Presidente do Tribunal de
origem (art. 1.035, § 8º).
Na hipótese oposta,
quando a repercussão geral for reconhecida, cabe ao STF julgar o recurso extraordinário
no prazo máximo de um ano, tendo preferência sobre os demais processos, com exceção
do habeas corpus e dos em que há réu preso (art. 1.035, § 9º). Também mandados
de segurança, individuais ou coletivos, deverão ter preferência por força do
disposto no art. 20 da Lei 12.016/2009 e, superiormente, dada a sua magnitude
constitucional.
Se o julgamento não
ocorrer no prazo estabelecido pelo § 9º do art. 1.035, a contar do reconhecimento
da existência da repercussão geral, os processos retomarão, em todo território nacional,
seu regular andamento, cessados os efeitos da suspensão prevista no § 5º do
art. 1.035 (art. 1.035, § 10).
O § 11 do art. 1.035, por
fim, impõe a divulgação da ata em que constar a súmula da decisão sobre a
repercussão geral pelo Diário Oficial com sua equiparação a acórdão. A
divulgação é medida que se afina com o ideal de publicidade do § 5º do art. 927
e deve ser prestigiada. A permissão para que a súmula da repercussão geral
corresponda ao acórdão, contudo, parece atritar com as condições exigidas para
viabilizar o real conhecimento do que foi efetivamente decidido, por quais
fundamentos. Não só na perspectiva de viabilizar um debate adequado sobre as
decisões do STF sobre repercussão geral, sobre sua jurisprudência acerca do
tema, portanto – o que é bem diferente da cláusula de irrecorribilidade
inscrita no caput do art. 1.035 –, mas também para tornar factível a sua
aplicação aos casos dispersos em todo território nacional que se relacionam
àquela questão constitucional, levando em conta, como não pode deixar de ser,
as especificidades do que foi efetivamente decidido.
9.4
Contrarrazões
Interposto o recurso
extraordinário ou o recurso especial, o recorrido será intimado para apresentar
suas contrarrazões. Terá o prazo de quinze dias para tanto (art. 1.030, caput),
findos os quais, os autos serão enviados ao Tribunal Superior,
independentemente de prévio juízo de admissibilidade.
A exemplo do que se deu
com a apelação (art. 1.010, § 3º) e com o recurso ordinário (art. 1.028, § 3º),
o parágrafo único do art. 1.030 suprimiu a competência do Presidente ou do
Vice-Presidente do Tribunal de interposição para o juízo de admissibilidade do
recurso extraordinário ou especial interposto, determinando a remessa do
recurso diretamente aos Tribunais Superiores, aos quais caberá fazer a
admissibilidade recursal.
A novidade, para além
daquela harmonização e da celeridade que quer imprimir no processamento
daqueles recursos, gerou um importante impacto na configuração do “agravo em recurso
especial e extraordinário” do art. 1.042, como demonstro no n. 10, infra.
9.5
Interposição simultânea
Pode acontecer de o
acórdão ter fundamentos tanto de ordem constitucional como de ordem legal federal.
O art. 1.031 regula expressamente essa hipótese, de interposição simultânea de
dois recursos, um extraordinário e um especial, cada um formulado em sua
própria petição (art. 1.029, caput).
Nesse caso, os autos
físicos serão enviados, em primeiro lugar, ao STJ para julgamento do recurso
especial (art. 1.031, caput); tratando-se de autos eletrônicos, a sua
disponibilização em primeiro lugar ao STJ atende suficientemente a previsão
legislativa. Julgado o recurso especial, os autos serão enviados (disponibilizados)
ao STF para apreciação e julgamento do recurso extraordinário, salvo se aquele
recurso for considerado prejudicado (art. 1.031, § 1º), o que acontecerá, por
exemplo, quando, a despeito da duplicidade de fundamentos, um legal federal e outro
constitucional, o objetivo do recorrente for único e for alcançado com o
julgamento do recurso especial.
Pode ocorrer, contudo, de
o relator sorteado no STJ entender que o recurso extraordinário deve ser
julgado em primeiro lugar porque, por exemplo, há alegação de
inconstitucionalidade da lei federal que embasa o recurso especial, verdadeira
questão prejudicial. Nesse caso, ele determinará a remessa (disponibilização)
dos autos ao STF (art. 1.031, § 2º). Se o relator do STF rejeitar aquele
entendimento, devolverá (disponibilizará) os autos para o STJ, que julgará o
recurso especial (art. 1.031, § 3º).
9.6
Reenvio
Os arts. 1.032 e 1.033
são novidades trazidas pelo CPC de 2015. Diferentemente do que ocorre na hipótese
do art. 1.031, eles não tratam de (dois) recursos, extraordinário e especial,
interpostos concomitantemente. Há, aqui, apenas, um recurso, especial ou
extraordinário e a discussão sobre quem é competente para julgá-lo consoante o
enfoque que seja dada à matéria nele versada.
O art. 1.032 cuida da
hipótese de o relator, no STJ, entender que o recurso especial versa sobre questão
constitucional. Neste caso, deverá conceder prazo de quinze dias para que o
recorrente demonstre a existência de repercussão geral – exigência específica
do recurso extraordinário, por força do § 3º do art. 102 da CF – e se manifeste
sobre a questão constitucional.
Após, o relator enviará
(disponibilizará) o recurso ao STF, que poderá devolvê-lo ao STJ caso entenda o
contrário, isto é, que, em verdade a questão não é constitucional (art. 1.032,
parágrafo único). Neste caso, é importante notar, a despeito do silêncio do
dispositivo, que aquele óbice deve ser superado pelo STJ e, nesse sentido, o
recurso deve ser conhecido e julgado.
A hipótese oposta é
regulada pelo art. 1.033: se o relator do recurso extraordinário entender que a
hipótese é, em verdade, de questão infraconstitucional “por pressupor a revisão
da interpretação de lei federal ou de tratado”, deve enviar o recurso para
julgamento ao STJ como recurso especial.
Aqui, diferentemente do
que se dá no art. 1.032, não há previsão para o STJ recusar sua competência
que, em última análise, deriva da própria CF (art. 105, III) e que encontra no
STF seu guardião-mor. Tanto quanto na hipótese anterior, portanto, é irrecusável
que o STJ deve julgar o recurso. Diferença sensível, contudo, é que, aqui, o
STJ ainda não proferiu o juízo de admissibilidade recursal e, em rigor, pode
fazê-lo a ponto de não conhecer do recurso desde que não infirme a decisão já
proferida pelo STF.
Ambas as regras
representam importante novidade trazida pelo CPC de 2015 para combater as dificuldades
decorrentes da “inconstitucionalidade reflexa”, que, em termos práticos, acaba
gerando verdadeiro vácuo de competência. Ademais, cabe acentuar que ambos os
dispositivos, os arts. 1.032 e 1.033, são reflexo inquestionável do modelo de
“processo cooperativo” desejado pelo CPC de 2015 desde seu art. 6º.
9.7
Julgamento
A única regra própria
codificada sobre o julgamento do recurso extraordinário ou especial é a do art.
1.034.
O caput do dispositivo,
ao tratar da abrangência do efeito devolutivo daqueles recursos, traz à lembrança
a Súmula 456 do STF, que tem o seguinte enunciado: “O Supremo Tribunal Federal,
conhecendo do recurso extraordinário, julgará a causa, aplicando o direito à
espécie”.
Sempre entendi, a
despeito da literalidade do enunciado e, mais do que ele, da própria textualidade
do novel art. 1.034, que a questão só pode ser analisada na perspectiva
constitucional.
Os incisos III dos arts.
102 e 105 da CF são limites intransponíveis para o legislador infraconstitucional:
o recurso extraordinário e o recurso especial pressupõem causa decidida, razão pela
qual entendo que questões não decididas, ainda que de ordem pública, não podem
ser julgadas ex novo pelo STF e pelo STJ naquelas sedes recursais.
Não se trata de sustentar
a aplicação do princípio da eficiência processual expressamente agasalhado no
inciso LXXVIII do art. 5º da CF. Trata-se, bem diferentemente, de invocar regra
de competência estrita, que preserva, como escrevo no n. 9, supra, a
competência recursal extraordinária e especial do STF e do STJ e, em última
análise, o papel que se espera daqueles Tribunais no modelo constitucional que,
nesses casos, não são e não podem se comportar como órgãos de revisão ampla.
Nem mesmo a lembrança do
§ 3º do art. 485 que, também na sua literalidade, insinua que questões de ordem
pública são cognoscíveis “em qualquer tempo e grau de jurisdição enquanto não
ocorrer o trânsito em julgado”. Evidentemente, não nego que o texto da regra
permite infirmar o que acabei de criticar. Nego, contudo, que ela possa querer
significar o que, na perspectiva do que aqui defendo, é inviável sem agredir o
modelo constitucional.
O caput do art. 1.034 e,
muito antes dele, a Súmula 456 do STF devem ser compreendidos no sentido de
que, conhecido o recurso extraordinário ou especial, o STF ou o STJ julgarão a
causa, aplicando a ela o direito constitucional ou legal federal adequado a
partir do arcabouço fático definido pelas manifestações jurisdicionais
anteriores. Aqueles Tribunais, diferentemente de tribunais de cassação
europeus, desempenham não só a função rescisória, mas também rescindente, isto
é, não se limitam a cassar ou invalidar o julgado contrário à CF ou à lei
federal porque estão habilitados, pelo modelo constitucional, a rejulgar a
causa nos limites em que decidida, aplicando, desde logo, ao caso concreto, a
solução que entendem ser adequada para a questão constitucional ou para a
questão legal federal. Não, prezado leitor, o recurso extraordinário e o
recurso especial não têm efeito translativo, sob pena de esbarrar em seu
condicionante constitucional, sempre e invariavelmente, a causa decidida.
Tanto mais interessante
esses questionamentos quando vem à lembrança que o texto final do CPC de 2015 –
fruto da revisão pela qual passou antes de seu envio à sanção presidencial –
acabou substituindo a palavra “causa”, que constava do Projeto da Câmara e no
texto aprovado pelo Senado em dezembro de 2014, pela palavra “processo”.
Haverá quem, ao ler o
dispositivo, tal qual redigido a final, ficará ainda mais confortável para sustentar
a incidência do que em geral se extrai da precitada Súmula 456 (julga-se o
processo, não apenas a causa decidida) com total desprezo aos limites constitucionais
impostos ao STF e ao STJ no exercício de sua competência recursal
extraordinária e especial, respectivamente. Se a palavra “processo” for
decisiva para albergar tal interpretação é irrecusável a inconstitucionalidade
formal de sua substituição naquele instante do processo legislativo.
De sua parte, o parágrafo
único do art. 1.034 remonta, para generalizá-las, às Súmulas 292 (“Interposto o
recurso extraordinário, por mais de um dos fundamentos indicados no art. 101,
n. III, da Constituição, a admissão apenas por um deles não prejudica o seu
conhecimento por qualquer dos outros”) e 528 do STF (“Se a decisão contiver
partes autônomas, a admissão parcial, pelo Presidente do Tribunal a quo, de
recurso extraordinário, que, sobre qualquer delas se manifestar, não limitará a
apreciação de todas pelo Supremo Tribunal Federal, independentemente de interposição
de agravo de instrumento”). Assim, conhecido o recurso extraordinário ou
especial por um fundamento, devolvem-se os demais para o julgamento do capítulo
impugnado.
Também aqui a
interpretação da regra precisa ser cuidadosa para não transbordar dos limites constitucionais
da “causa decidida”, expressa nos incisos III dos arts. 102 e 105 da CF. Parece
ser esta a explicação que justificou a redução de texto na última etapa do
processo legislativo, antes, portanto, da revisão final que antecedeu seu envio
à sanção presidencial, retirando do dispositivo a menção à devolução “de todas
as questões relevantes para a solução do capítulo impugnado”, preservando, como
se lê, apenas os “demais fundamentos” para aquele mesmo fim. Se, até mesmo, no
recurso de apelação, em que opera o efeito translativo, o § 1º do art. 1.013
houve por bem restringir a transferência da matéria para a parte (o capítulo)
da decisão efetivamente impugnada, o que dizer do recurso especial ou
extraordinário, no qual não há – nem pode haver, por causa do modelo
constitucional – aquele efeito?
9.8
Recursos extraordinário e especial repetitivos
Como anunciei no início
do número anterior, a Subseção II da Seção II do Capítulo VI do Título II do
Livro III da Parte Especial disciplina o julgamento dos recursos
extraordinários e dos recursos especiais repetitivos, estendendo-se do art.
1.036 ao art. 1.041.
Destaco de plano que, no
CPC de 2015, não só o recurso especial, mas também o recurso extraordinário
passa a receber disciplina de recurso repetitivo. É inegável, assim, o avanço
do CPC de 2015 em relação à disciplina do art. 543-B do CPC de 1973, que, em
rigor, não admitia o processamento e o julgamento de recursos extraordinários
repetitivos, mas, menos que isso, apenas a discussão sobre recursos
extraordinários múltiplos apresentarem, ou não, repercussão geral. É, nesse
sentido, da mesma disciplina que ocupa o art. 1.035, como os seus §§ 5º a 10
deixam entrever.
Ademais, é inegável que o
art. 543-C do CPC de 1973 limitava-se à disciplina dos recursos especiais
repetitivos, não obstante a prática do STF ter consagrado também o
processamento dos extraordinários como repetitivos.
De qualquer sorte, o CPC
de 2015 coloca fim a quaisquer discussões que, no âmbito do CPC de 1973,
poderiam ser desenvolvidas a partir da constatação que acabei de fazer, como a
leitura do caput do art. 1.036 evidencia, ao se referir à existência de
“multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em
idêntica questão de direito”. O mesmo dispositivo, outrossim, autoriza que os
regimentos internos dos Tribunais Superiores disciplinem o instituto, respeitados
(sempre) os ditames constitucionais e legais.
Assim, havendo a referida
multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em
idêntica questão de direito – a mesma tese de direito constitucional ou de
direito legal federal a incidir sobre casos concretos iguais na essência –, é cabível
que alguns recursos sejam selecionados e decididos pelo STF ou pelo STJ, com o
sobrestamento de todos os demais, na expectativa de que a solução dada nos
casos julgados por aqueles Tribunais seja aplicada e observada por todos os
demais órgãos jurisdicionais. É esse, em suma, o objetivo da disciplina que ocupa,
com detalhes, os arts. 1.036 a 1.041, que, nessa perspectiva, quer concretizar
a diretriz do inciso III do art. 927.
9.8.1
Identificação da ocorrência de recursos múltiplos e sua seleção
Para tanto, põe-se, em
primeiro lugar, a tarefa de verificar se há a multiplicidade de recursos extraordinários
ou especiais sobre a mesma questão de direito e, em seguida, os critérios de seleção
dos casos a serem enviados para o processo conjunto.
O § 1º do art. 1.036
regula a hipótese de a multiplicidade de recursos ser verificada no âmbito dos
TJs ou dos TRFs. Nesse caso, o Presidente ou o Vice-Presidente daqueles
Tribunais – é o regimento interno quem define a competência – selecionará, ao
menos, dois recursos extraordinários ou especiais “representativos da
controvérsia” para envio aos Tribunais Superiores.
A iniciativa quer
viabilizar, perante o STF ou o STJ, o proferimento de decisão que reconhece o status
de recursos repetitivos a partir dos selecionados, afetando-os, segundo decisão
cuja disciplina está no art. 1.037.
A escolha feita pelos
Presidentes dos TJs ou dos TRFs, contudo, não vincula o relator do STF ou do
STJ, que poderá escolher outros, desde que também sejam representativos da
controvérsia (art. 1.036, § 4º). Tanto assim que também cabe aos Ministros do
STF e do STJ, com fundamento no § 5º do art. 1.036, tomarem a iniciativa de
selecionar dois ou mais recursos representativos da controvérsia para submissão
de seu julgamento à disciplina dos repetitivos.
O § 6º do art. 1.036
esclarece o que deve ser compreendido como “recurso representativo da controvérsia”.
Trata-se de recurso que, versando sobre a idêntica questão jurídica que se
repete, “contenham abrangente argumentação e discussão a respeito da questão a
ser decidida”. Essa exigência é fundamental para a boa aplicação da disciplina
dos representativos, porque é a partir da diversidade e profundidade da
sustentação da questão jurídica e, correlatamente, das teses jurídicas por ela
representada, a favor e contra, que os julgamentos do STF e do STJ assumirão
verdadeiro padrão paradigmático. Só assim é que eles terão aptidão de produzir
o que, para o CPC de 2015, pode ser chamado de “precedente”.
9.8.2
Suspensão dos processos determinada pelo TJ ou TRF
O Presidente ou
Vice-Presidente dos TJs ou TRFs determinará a suspensão de todos os processos pendentes,
individuais ou coletivos, em trâmite no Estado ou na Região, respectivamente,
quando tomar a iniciativa de identificar e selecionar recursos múltiplos para
julgamento como repetitivos perante o STF ou STJ, como lhe determina o mesmo §
1º do art. 1.036. Tal suspensão, de acordo com o § 1º do art. 1.037, fica na
dependência de o STF ou de o STJ proferir decisão de afetação, nos termos do
caput do art. 1.037, isto é, reconhecer que há multiplicidade de recursos extraordinários
ou especiais que devem ser submetidos ao regime de julgamento repetitivo.
O § 2º do art. 1.036,
referindo-se à suspensão determinada no âmbito dos TJs ou dos TRFs, e similarmente
ao disposto no § 6º do art. 1035, autoriza o interessado (o recorrido) a
requerer, perante aqueles magistrados, a exclusão de recurso extraordinário ou
especial intempestivo da decisão de sobrestamento.
Aqui também o mesmo
dispositivo estabelece o prazo de cinco dias para que o recorrente manifeste-se
sobre o requerimento. Sem novidades, a decisão que indeferir o pedido de
exclusão, sujeita-se ao agravo em recurso especial ou extraordinário (art.
1.042, I), tudo em consonância com o § 3º do art. 1.036. Por força do mesmo
raciocínio que exponho no n. 9.3, supra, a propósito do § 6º do art. 1.035, o
interessado deve formular seu pedido de exclusão pela intempestividade no prazo
de cinco dias, contado da decisão que determina o sobrestamento dos processos.
9.8.3
Decisão de afetação
O art. 1.037 trata das
providências a serem tomadas pelo relator no STF ou no STJ quando reconhecer
estarem presentes os pressupostos no caput do art. 1.036, isto é, quando
constatar a existência de “multiplicidade de recursos extraordinários ou
especiais com fundamento em idêntica questão de direito”.
Selecionados os recursos
que serão concretamente julgados, o relator proferirá o que o art. 1.037 chama
de “decisão de afetação”, na qual: (i) identificará com precisão a questão a
ser submetida a julgamento (art. 1.037, I), sendo vedado o julgamento fora
desses limites (art. 1.037, § 2º), possibilitanto, contudo, a identificação de
outras questões para julgamentos futuros a partir dos processos enviados aos
Tribunais Superiores (art. 1.037, § 7º); (ii) determinará a suspensão dos processos
pendentes, individuais e coletivos, que versem sobre aquela mesma questão em
todo o território nacional (art. 1.037, II); e, por fim, (iii) poderá
requisitar aos Presidentes ou aos Vice-Presidentes dos TJs ou TRFs a remessa de
um recurso representativo da controvérsia (art. 1.037, III).
A possibilidade dessa
requisição, tal qual prevista no inciso III do art. 1.037, é fruto da revisão a
que foi submetido o texto do CPC de 2015 antes do envio à sanção presidencial.
O texto aprovado no Senado Federal, na sessão deliberativa de 17 de dezembro de
2014, era diverso, impondo aquela requisição (v. art. 1.034, III, do Anexo ao
Parecer n. 956/2014 do Senado, idêntico ao art. 1.050, III, do Projeto da Câmara),
empregando o verbo requisitar no imperativo afirmativo (requisitará). Não há
como deixar de interpretar a regra desta forma, a única capaz para transpor sua
inconstitucionalidade formal no sentido de ser obrigatório ao relator do
Tribunal Superior, em sua decisão de afetação, determinar a remessa de ao menos
um recurso representativo da controvérsia a todo TJ e a todo TRF, que o enviará
a não ser que, por qualquer razão, aquela questão não tenha, no Estado ou na
Região respectiva, nenhum processo. A iniciativa, tal qual votada, quer
pluralizar o debate jurídico que antecede a fixação da tese nos casos dos
recursos repetitivos, indo ao encontro, ademais, com a iniciativa reconhecida
àqueles Tribunais pelo § 1º do art. 1.036. A redação final, ao sugerir que se
trata de mera faculdade do relator do Tribunal Superior vai em direção oposta
e, por isso, atrita com os limites existentes naquele instante do processo
legislativo (art. 65 da CF).
Caso não haja afetação,
como escrevo no n. 9.8.2, supra, com base no § 1º do art. 1.037, o relator do
recurso repetitivo no âmbito do STF ou do STJ comunicará o fato aos Presidentes
ou aos Vice-Presidentes dos Tribunais de segunda instância para revogação da
decisão de suspensão prevista no § 1º do art. 1.036.
Se houver mais de uma
afetação, isto é, mais de uma decisão proferida para os fins do art. 1.037, estará
prevento o relator que, em primeiro lugar, proferiu a decisão respectiva (art.
1.037, § 3º).
Uma vez afetado, o
recurso deverá ser julgado no prazo de um ano, consoante estabelece o § 4º do art.
1.037, excepcionados os habeas corpus e casos em que há réu preso, rol ao qual
insisto no acréscimo do mandado de segurança, individual ou coletivo, pela sua
magnitude constitucional.
Após aquele prazo –
contado da publicação de afetação –, cessa o sobrestamento dos processos (art.
1.037, § 5º), sem prejuízo de outro relator do mesmo Tribunal Superior afetar
dois ou mais novos recursos representativos da controvérsia (art. 1.037, § 6º).
9.8.4
Suspensão dos processos determinada pelos Tribunais Superiores
Os §§ 8º a 13 do art.
1.037 disciplinam as consequências do sobrestamento dos processos a partir da
suspensão prevista no inciso II do art. 1.037.
As partes, de acordo com
o § 8º do art. 1.037, devem ser intimadas do sobrestamento determinado pela
decisão de afetação, a ser proferida no seu próprio processo, pelo juiz ou pelo
relator, consoante o estágio em que o processo encontrava-se quando da sua
suspensão. “E quem é essa parte?”, perguntará o prezado leitor. A melhor resposta
é no sentido de que se trata da parte a quem o prosseguimento do processo
interessa.
A parte poderá requerer o
prosseguimento do processo arguindo que a questão nele decidida não está
abrangida pela decisão de afetação, isto é, que não trata da mesma questão que
será julgada pelo STF ou pelo STJ (art. 1.037, § 9º). Pelas mesmas razões que
exponho a propósito do § 6º do art. 1.035 e do § 2º do art. 1.036 nos ns. 9.3 e
9.8.2, supra, é correto entender que a parte dispõe do prazo de cinco dias para
tanto.
O requerimento será
dirigido à autoridade judicial consoante o processo esteja na primeira instância,
no TJ ou no TRF, antes ou depois da interposição do recurso especial ou
extraordinário ou, ainda, se o processo já estiver no Tribunal Superior (art. 1.037,
§ 10), estabelecendo-se contraditório com a parte contrária em cinco dias (art.
1.037, § 11).
Acolhido o pedido, isto
é, reconhecida a distinção, como se lê no § 12 do art. 1.037, o processo voltará
a tramitar normalmente e, em se tratando de recurso extraordinário ou especial
sobrestado indevidamente, ele deverá ser enviado ao STF ou ao STJ
independentemente do juízo de admissibilidade.
A decisão que resolve o
requerimento formulado com base no § 9º do art. 1.037, seja acolhendo-o ou
rejeitando-o, é recorrível. Se se tratar de decisão proferida pelo juízo de
primeira instância, dela caberá agravo de instrumento (art. 1.037, § 13, I); se
a decisão for proferida no âmbito dos Tribunais, o recurso será o de agravo
interno (art. 1.037, § 13, II).
Entendo irrecusável a
aplicação do § 2º do art. 982 durante a suspensão dos processos, ainda que textualmente
a previsão nele contida, de ser competente o órgão jurisdicional no qual
tramita o processo sobrestado para apreciação de eventual pedido de tutela de
urgência, limite-se ao incidente de resolução de demandas repetitivas. Trata-se
de decorrência da sistemática criada pelo art. 928 (afinal, tanto aquele
incidente como os recursos repetitivos são e devem ser tratados como “julgamento
de casos repetitivos”) e, superiormente, do próprio inciso XXXV do art. 5º da
CF.
Uma derradeira observação
merece ser feita: deve ser dada ampla publicidade à decisão de afetação
disciplinada pelo art. 1.037, observando-se as diretrizes que o art. 979 e seus
§§ 1º e 2º estabelecem para o incidente de resolução de demandas repetitivas.
Trata-se de determinação expressa, embora fora de lugar, do § 3º daquele mesmo
dispositivo e que está em plena harmonia com o que o dispõe, mais
genericamente, o § 5º do art. 927.
9.8.4.1
Suspensão no caso do incidente de resolução de demanda repetitiva
O § 4º do art. 1.029
ocupa-se com a hipótese de o Presidente do STF ou do STJ receber requerimento
de suspensão dos processos em todo o território nacional durante a tramitação
do incidente de resolução de demandas repetitivas. Neste caso, diante de razões
de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, a suspensão pode ser
estendida a todo o território nacional, até ulterior decisão do recurso
extraordinário ou do recurso especial a ser interposto.
Trata-se de regra que
merece ser lida ao lado do § 3º do art. 982 para evidenciar que a suspensão eventual
concedida atrela-se, necessariamente, ao recurso extraordinário ou especial a
ser interposto com fundamento no art. 987, como dispõe, aliás, o § 5º do
próprio art. 982. De qualquer sorte, como escrevo no n. 9.8 do Capítulo 16
acerca do art. 982, a regra merece ser interpretada com temperamentos, embora
localizada fora de lugar.
Outro ponto que merece
destaque sobre o § 4º do art. 1.029 é o de que a suspensão dos processos pode
dar-se não só em função de “razões de segurança jurídica” (como exige o § 3º do
art. 982), mas também e alternativamente por causa de “excepcional interesse
social”. A vagueza de ambas as expressões, máxime a segunda só aqui referida,
recomenda redobrada cautela na análise do pedido. O requerimento não pode ser
tratado como mais um caso do esdrúxulo (inconstitucional e desnecessário, ao
menos do ponto de vista jurídico) “pedido de suspensão” e da não menos esdrúxula
(e inconstitucional) tese de sua “ultra-atividade”.
9.8.5
Preparação para julgamento
O caput e os §§ 1º a 2º
do art. 1.038 têm como objetivo fomentar o prévio debate sobre a tese a ser
julgada no recurso afetado como repetitivo.
O inciso I do art. 1.038
permite ampla participação de terceiros intervenientes na qualidade de amici
curiae. São aqueles intervenientes que farão as vezes das “pessoas, órgãos ou
entidades com interesse na controvérsia, considerando a relevância da matéria”,
observando, desde que não haja restrição à sua ampla participação, fundamentada
genericamente no art. 138, o que dispuser o RISTF e do RISTJ.
O inciso II do art. 1.038
prevê a possibilidade de oitiva de depoimentos de pessoas com experiência e
conhecimento na matéria em audiências públicas. A iniciativa não se sobrepõe à oitiva
do amicus curiae, porque ela cria espaço adequado e racional para que sejam
travadas as discussões sobre a tese que, a partir da questão de direito
repetitiva, se pretende fixar. A prática já é comum nos Tribunais Superiores,
com enorme frequência no STF.
Os próprios tribunais de
segunda instância poderão ser instados a prestar informações e o Ministério
Público será ouvido como fiscal da ordem jurídica (art. 1.038, III). Os prazos,
para tanto, são de quinze dias e, de preferência, as manifestações serão
eletrônicas (art. 1.038, § 1º).
Nada há que impeça, não
obstante o silêncio das regras que acabei de destacar, que os próprios recorrentes,
individualmente considerados, queiram se manifestar para os fins do art. 1.038.
Sua intervenção, contudo, não os torna amicus curiae. Serão, sempre e
invariavelmente, partes, interessadíssimas no desfecho da questão, e é nessa
qualidade, e nenhuma outra, que poderão pretender ser manifestar.
Colhidas as informações,
o processo será incluído em pauta, devendo ser julgado com preferência, com as
ressalvas do § 2º do art. 1.038, às quais merece ser incluído também o mandado de
segurança, não só por causa da previsão do art. 20 da sua lei de regência, Lei
n. 12.016/2009, mas também pela sua magnitude constitucional.
O § 3º do art. 1.038
harmoniza-se com o que o § 2º do art. 984 exige para o acórdão que julgar o incidente
de resolução de demandas repetitivas. Assim, o “conteúdo do acórdão abrangerá a
análise de todos os fundamentos da tese jurídica discutida, favoráveis ou
contrários”. Trata-se de exigência essencial para a construção de um verdadeiro
direito jurisprudencial brasileiro, coerente, por isso mesmo, ao que dispõe o §
1º do art. 927 que, por sua vez, conduz ao inciso IV do § 1º do art. 489.
9.8.6
Julgamento e consequências
O art. 1.039 inicia a
regulamentação das consequências do julgamento do recurso representativo da
controvérsia, isto é, do recurso repetitivo ou afetado, que é completada pelos
arts. 1.040 e 1.041.
9.8.6.1
No STF e no STJ
O dispositivo ocupa-se
com os recursos que foram sobrestados e que estão no âmbito dos próprios
Tribunais Superiores. Para eles, decidido o repetitivo, os recursos que estavam
sobrestados por tratarem da mesma controvérsia serão considerados prejudicados
ou decididos com aplicação da tese fixada.
O prezado leitor
perceberá que o caput do art. 1.039 faz expressa referência a “órgãos colegiados”.
São eles, portanto, que julgarão aqueles recursos de acordo com a diretriz
imposta pelo dispositivo, excepcionando, destarte, para estes casos, a atuação
monocrática com fundamento nas alíneas b dos incisos IV e V do art. 932.
Chegando novos recursos ao STF ou ao STJ – o que, com base no caput do art.
1.041, tem tudo para ocorrer –, o proferimento de decisões monocráticas com
base naquelas regras estará autorizada.
O parágrafo único do art.
1.039 dispõe que os recursos extraordinários sobrestados serão considerados
automaticamente inadmitidos quando não for reconhecida a repercussão geral no recurso
extraordinário afetado. Também aqui, é correto entender que a regra dirige-se exclusivamente
ao STF.
9.8.6.2
Nos TJs, nos TRFs e na primeira instância
O art. 1.040 é
vocacionado para regrar os efeitos que o CPC de 2015 quer que o julgamento do repetitivo
pelo STF ou pelo STJ surta sobre os processos até então suspensos nos TJs, TRFs
e também na primeira instância.
Não tenho a menor dúvida
de que, na perspectiva do CPC de 2015, o que se espera é que a decisão do
recurso afetado seja necessariamente observada pelos demais órgãos
jurisdicionais, no que é claro, aliás, o inciso III do art. 927.
É ler os incisos do art.
1.040, segundo os quais, após a publicação do acórdão paradigma, isto é, do
acórdão do recurso afetado: (i) o Presidente ou o Vice-Presidente do TJ ou do
TRF negará seguimento aos recursos especiais ou extraordinários sobrestados na
origem, se o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Tribunal Superior;
(ii) o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o
processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso
anteriormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do
Tribunal Superior; e, por fim, (iii) os processos suspensos em primeiro e
segundo graus de jurisdição retomarão o curso para julgamento e aplicação da
tese firmada pelo Tribunal Superior.
Os verbos e a oração que
fiz questão de colocar em itálico não foram conjugados no imperativo pelos
próprios incisos, apresso-me a esclarecer, por razão outra que não para impor o
resultado alcançado pelos Tribunais Superiores a partir do caso julgado como
paradigmático, a partir da decisão de afetação a todos os demais Tribunais,
inclusive aos juízos de primeira instância.
Sobre o caráter
vinculante, embora não expresso nem escrito, mas inequivocamente pretendido pelo
CPC de 2015 em dispositivos como o art. 1.040, são bastantes as considerações
que faço a propósito dos arts. 926 e 927 no n. 2 do Capítulo 16.
Para cá, prezado leitor,
quero acentuar que a redação dada aos incisos I e II do art. 1.040 busca contornar
crítica que, para a sistemática do CPC de 1973, fazia com veemência no volume 5
do meu Curso sistematizado de direito processual civil, quanto a haver, no
sistema anterior, verdadeira hipótese de delegação legal de competência para
que os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais julgassem os
recursos extaordinários e os recursos especiais sobrestados em consonância com
a decisão proferida no âmbito do STF ou do STJ. A previsão, feita por lei (art.
543-C, § 7º, II, do CPC de 1973), atritava a olhos vistos com a competência
constitucional reconhecida (e taxativamente) ao STF e ao STJ de eles, não
outros Tribunais ou órgãos jurisdicionais, julgarem recursos extraordinários e
especiais (arts. 102, III, e 105, III, da CF, respectivamente).
O que fizeram os incisos
I e II do art. 1.040 para contornar o problema? Evitaram estabelecer o julgamento
dos próprios recursos especial e extraordinário pelo TJ ou pelo TRF. Em vez
disso, o inciso I limitou-se a prever que o Presidente ou o Vice-Presidente do
tribunal de origem negará seguimento aos recursos especiais ou extraordinários
sobrestados quando o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Tribunal
Superior. No inciso II está previsto que o órgão prolator do acórdão recorrido
reexaminará, não o próprio recurso especial ou o extraordinário sobrestado, mas
“o processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso
anteriormente julgado”, se ele contrariar a orientação do Tribunal Superior. Ocorre
que a hipótese do inciso I do art. 1.040 é julgamento de mérito, no sentido de
improver o recurso extraordinário ou especial sobrestado, isto é, negar
provimento àquele recurso. O “negar seguimento” autorizado pelo dispositivo,
portanto, continua a ser caso de delegação legal de competência
constitucionalmente fixada. Apesar da redação diferente, dada pelo CPC de 2015
à hipótese, a crítica que acima destaquei permanece hígida. Para negar
seguimento no sentido correto da expressão, querendo com ela descrever que o
recurso está “prejudicado” porque o acórdão recorrido já coincide com a decisão
paradigmática proferida pelo STF ou pelo STJ, precisaria haver o que não há no
modelo constitucional do direito processual civil, a saber, “súmulas” ou “precedentes”
ou “jurisprudência” impeditivos de recurso. Uma tal figura, contudo, não existe
no plano constitucional, sendo descabido que a lei a crie ou algo que lhe faça
as vezes.
No caso do inciso II do
art. 1.040, o que ocorre é de ordem diversa. O dispositivo, para fugir à indevida delegação de competência, acabou por
criar uma nova figura recursal que causa verdadeiro retrocesso processual no
sentido de permitir que o processo volte um ou dois estágios.
É que, a depender do
julgamento do STF e do STJ, o recurso extraordinário ou o recurso especial sobrestado
tem o condão de viabilizar um novo julgamento do que já foi julgado por aqueles
Tribunais.
O julgamento dos
processos de competência originária dos TJs e dos TRFs, da remessa necessária e
dos recursos em geral, passa a ser realizado com condição, qual seja a de haver
afetação de recurso repetitivo e de haver interposição de recurso
extraordinário ou especial que venha, por causa da afetação, a ser sobrestado.
Se o que for decidido no âmbito do STF ou do STJ contrariar o julgamento
anterior do TJ ou do TRF, cabe a eles o rejulgamento na perspectiva, é o que o
CPC de 2015 realmente quer, de que voltem atrás em seu posicionamento.
Friso o ponto: o
julgamento, já encerrado (tanto que objeto de recurso extraordinário ou
especial), será retomado “se o acórdão recorrido contrariar a orientação do
tribunal superior”. Trata-se de hipótese que merece reflexão mais detida,
inclusive na perspectiva da (in)eficiência processual (art. 5º, LXXVIII, da
CF), e que devia estar prevista ao lado das demais hipóteses do art. 494, como um
novo e até então inédito caso não alcançado pelo princípio da invariabilidade
das decisões jurisdicionais.
Para ambas as previsões
(art. 1.040, I e II), entendo que o mais adequado seria refletir sobre se não
seria mais adequado do ponto de vista normativo, sempre pensado desde o “modelo
constitucional” – e há como pensar o direito processual civil fora dele? –,
alterar os incisos III dos arts. 102 e 105 da CF e permitir, com isso, que os
TJs e os TRFs cooperem assumida e legitimamente com o trato dos recursos
repetitivos. Sem prévia alteração constitucional, contudo – e sempre com o
devido respeito do entendimento contrário –, não consigo reconhecer
juridicidade a essas verdadeiras manobras legislativas.
De acordo com o inciso
III do art. 1.040, os processos suspensos em primeiro e segundo graus de jurisdição
– antes do julgamento, portanto, porque, caso contrário, estariam sujeitos às
hipóteses dos incisos I ou II – retomarão o curso para julgamento e aplicação
da tese firmada pelo Tribunal Superior. A minha crítica com relação ao
dispositivo coincide com as observações sobre o caráter vinculante pretendido
pelo CPC de 2015 aos julgamentos dos “casos repetitivos”. Por isso, também aqui,
entendo suficiente o que escrevo a propósito dos arts. 926 e 927 no n. 2 do
Capítulo 16.
Na revisão a que o texto
do CPC de 2015 foi submetido antes de ser enviado à sanção presidencial, a
regra que se encontrava como um dos parágrafos do que fazia as vezes de seu
art. 1.038 (art. 1.051, § 6º, do Projeto da Câmara e art. 1.035, § 6º, do Anexo
ao Parecer n. 956/2014, que foi o texto submetido à aprovação do Senado Federal
em dezembro de 2014) acabou sendo realocada como inciso IV do art. 1.040.
Trata-se de importante dispositivo que encontra seu par no § 2º do art. 985, a
propósito do incidente de resolução de demandas repetitivas, e que impõe a comunicação
do resultado do julgamento do repetitivo ao órgão, ao ente ou à agência
reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação da tese adotada
quando o recurso envolver questão relativa à prestação de serviço concedido,
permitido ou autorizado.
Bem entendida, é possível
extrair da regra condições ótimas de fortalecer, devidamente, o papel do Estado
regulador e de suas agências reguladoras no controle de condutas no âmbito administrativo,
minimizando, com isso, a necessidade de ingresso no Judiciário. É algo que, na perspectiva
dos §§ 2º e 3º do art. 3º, é amplamente desejável e absolutamente harmônico com
o modelo constitucional.
O art. 1.040 traz, ainda,
três parágrafos, que foram acoplados a ele apenas na redação final a que o
texto do CPC de 2015 foi submetido antes de ser enviado à sanção presidencial.
Eles indicam consequências a partir do julgamento do recurso afetado pelo STF
ou pelo STJ, pressupondo que as partes não tenham se voltado à suspensão do
processo nos moldes dos §§ 8º a 13 do art. 1.037 ou, ao menos, após o
indeferimento do pedido, inclusive no âmbito recursal. Nesse sentido, parece-me
correto afirmar que acabam disciplinando uma das variadas hipóteses do que pode
ocorrer a partir do que prevê o inciso III do art. 1.040.
O § 1º do art. 1.040
assegura expressamente a possibilidade de o autor desistir da ação, isto é, manifestar
sua vontade no sentido de deixar de pretender que o Estado-juiz tutele o
direito que afirma ter em face do réu, antes do proferimento da sentença, se a
questão que dá fundamento ao seu pedido de tutela jurisdicional for idêntica à
resolvida pelo recurso representativo da controvérsia.
Se a desistência ocorrer
antes de ofertada a contestação – o que, em regra, pressupõe audiência de conciliação
ou de mediação frustrada, inclusive pela ausência de autocomposição –, o autor
ficará isento do pagamento de custas e sucumbência (art. 1.040, § 2º). Trata-se
de verdadeiro incentivo para não litigar, aceitando a decisão paradigmática (o
“precedente”) emanada do STF ou STJ, o que é bem diverso de pretender que ela
tenha caráter vinculante, impondo-a.
O § 3º do art. 1.040, em
nítida sintonia com esse mesmo objetivo, excepciona a regra do § 4º do art. 485
e exclui a necessidade de prévia concordância do réu com a desistência, mesmo
quando a contestação já tiver sido ofertada. É regra também que quer incentivar
a observância do julgamento do recurso afetado, respeitando-o como verdadeiro
precedente. Não à força e, por isso, legítima e digna de elogios, até porque
harmônica ao que estatuem os §§ 2º e 3º do art. 3º.
9.8.7
Manutenção do acórdão recorrido
O caput do art. 1.041
ocupa-se com a hipótese oposta das previstas pelos incisos I e II do art. 1.040,
qual seja a de manutenção do acórdão divergente pelo tribunal de origem, isto
é, quando não ocorrer o que aquelas regras querem que aconteça. Nesse caso, o
recurso extraordinário ou o especial será enviado ao STF ou ao STJ, consoante o
caso, “na forma do art. 1.036, § 1º”.
A remissão feita pelo
caput do art. 1.041 parece estar equivocada porque aquele dispositivo cuida de
hipótese totalmente diversa, ainda preparatória do proferimento da “decisão de
afetação” do caput do art. 1.037, incompatível, portanto, com o momento regrado
pelo dispositivo. Melhor, por isso, pensar que a hipótese seja regrada pelo §
1º do art. 1.030 no sentido de os recursos serem enviados aos Tribunais
Superiores “independentemente de juízo de admissibilidade”.
9.8.8
Julgamento de outras questões perante o tribunal de origem
Os dois parágrafos do
art. 1.041, diferentemente do caput, regulam variantes à hipótese de ter havido
“juízo de retratação”, isto é, de o tribunal de origem, sempre entendido como
tal os TJs ou os TRFs, ter alinhado seu acórdão ao que decidido pelo STF ou
pelo STJ.
De acordo com o § 1º,
realizado o juízo de retratação, compete ao tribunal de origem decidir as demais
questões ainda não decididas, cujo enfrentamento se tornou necessário em
decorrência da alteração de entendimento. É dispositivo que só robustece a
crítica que lanço no n. 9.8.6.2, supra, porque permite que o TJ ou o TRF reabra
o segmento recursal já encerrado a partir do que o STF ou o STJ decidir.
Trata-se, tanto quanto o que já escrevi, de verdadeiro retrocesso. E mais: não
há como impedir que desse novo julgamento, que não infirma nem quer infirmar o
que STF ou STJ já decidiu, caibam novos recursos, extraordinário ou especial,
consoante o caso, para contrastar aquilo que traz de novidade.
O § 2º do art. 1.041,
tratando (e expressamente) da situação do inciso II do art. 1.040, regula a hipótese
de o recurso – que só pode ser o especial ou o extraordinário sobrestado –
versar sobre outras questões além daquelas julgadas pelo STF ou STJ e que gerou
o juízo de retratação pelo “órgão de origem”, isto é, pela Câmara ou Turma que
julgou (e rejulgou) o processo de competência originária, a remessa necessária
ou o recurso anteriormente julgado. Nesse caso, o Presidente (ou o Vice-Presidente,
sempre a depender da previsão de cada regimento interno) do tribunal
determinará a remessa do recurso ao STF ou ao STJ para seu julgamento,
independentemente de ratificação, e, embora a ressalva fosse desnecessária
diante do parágrafo único do art. 1.030, independentemente de juízo de
admissibilidade.
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Bons
estudos a todos e sucesso!
ANDRÉ
DA SILVA CARDOSO
Acadêmico
de Direito – Faculdade Gamaliel
6º
Período
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